Uma breve história do Direito de Autor

O avanço tecnológico sempre influenciou diretamente a maneira de acesso às obras e o Direito de Autor sempre foi concebido e desenvolvido como consequência dessas constantes mudanças.

Homem trabalhando em uma mesa em frente à um mural cheio de colagens e fotos

A doutrina já concluiu que a história do direito de autor é um processo de ração jurídica aos desafios da técnica.

Em meados de 1455, a invenção da prensa mecânica tipográfica por Gutemberg, tornou possível a difusão de obras literárias e artísticas, pela capacidade de reproduzir as obras por meios mecânicos. A prensa em si foi uma revolução, pois modificou todo o contexto da informação escrita. A partir daquele momento, a informação não era mais privativa dos nobres e clérigos.

Decorrência do invento, surgiram os privilégios de impressão que eram concedidos pelos Monarcas, ou pela administração das cidades ou ainda pelos Senhores das terras. Estes seriam os antecessores do Direito de Autor, espécies de exclusivos tais e quais os monopólios industriais. Os privilégios eram outorgados pelo Rei aos livreiros, que imprimiam os livros e figuras. Numa espécie de comparação, os livreiros cumpririam funções similares às dos editores na atualidade.   Pelos idos de 1486, nova espécie de privilégio é concedida a determinadas obras de determinados autores, por sua importância. Essa espécie de exclusivo ganhou força e se multiplicou a partir do século seguinte.

Surgiu a primeira regulamentação jurídica do Direito de Autor, com o reconhecimento do direito de cópia, a partir do Copyright Act em 1710, sancionado pela Rainha Ana de Inglaterra, conhecido então como Estatuto da Rainha Ana. Neste texto legislativo é fundada a tradição de copyright e encontra-se a primeira determinação de titularidade dos direitos de autor atribuída aos autores. Somente com a autorização destes era possível reproduzir suas obras. Frise-se que o título desta lei a colocava como um ato com o objetivo de encorajar o aprendizado.

Algumas décadas depois, a Revolução Francesa de 1789 influencia o direito de autor. Com os ânimos menos exaltados após a Revolução, a França recria o direito de autor com uma visão de que estes são consequência natural da criação proveniente do intelecto, e, por isto, pertencente ao sujeito criador. Assim, em 24/07/1793 são consagrados os direitos de reprodução aos autores franceses, dando início a outra tradição do Direito de Autor, adotada na maioria dos países do mundo, qual seja, Droit d´auteur. 

Resultado da revolução elétrica e de invenções como o telefone, o rádio, a televisão e o cinema, data de 1886 a Convenção de Berna por iniciativa dos próprios autores. O acesso às obras se multiplicava numa velocidade nunca dantes pensada. Os autores precisavam se proteger na esfera internacional. 

Enquanto isso, no Brasil, a Lei que criou os primeiros cursos de Direito, Lei  “Crêa dous Cursos de sciencias jurídicas e sociaes, um na cidade de São Paulo e outro na cidade de Olinda”, de 11 de agosto de 1827, em seu artigo 7 º teria sido a primeira contemplar criadores com uma exclusividade, uma espécie de privilégio sobre as obras. Neste ponto, vale dizer que o Brasil escravocrata se encontrava muito atrasado em relação ao resto do mundo.

Mais tarde, em 1890 o primeiro Código Penal da República do Brasil verbaliza enfim a proteção autoral, o Decreto nº 847, de 11 de outubro de 1890, tratou, em seu Capítulo V, “Dos Crimes Contra a Propriedade Litteraria, Artistica, industrial e Comercial”, nos artigos 342 até 355. Mesmo que apenas com tratamento criminal, protegia os direitos de reprodução e representação, a fim de evitar o plagio e a contrafação. Apenas um ano depois, a primeira Constituição Republicana garantiu o primeiro direito de exclusivo aos autores, seguindo uma orientação da tradição anglo-saxônica do copyright, seguida apenas oito anos depois pela primeira Lei de Direito de Autor do Brasil, a Lei n.º 496.

O século XX chega com volúpia e meios de reprodução em massa. Reprografia, fita cassete e a fita videocassete. Aqui começa o muro de lamentações, prejuízos inestimáveis segundo editores, produtores musicais e de audiovisuais, supervalorizando suas perdas. Nesta altura, infelizmente, é consolidada a nova toada do Direito Autoral: o capitalismo financeiro e os interesses das indústrias culturais.

O Brasil promulga um Código Civil em 1916, classificando o Direito de Autor como propriedade, posição dominante na época. Inobstante a publicação de algumas leis esparsas, o Brasil publica um estatuto único em 1973 para regulação do direito de autor, a Lei nº 5988, que apesar de reputar os direitos de autor como bens móveis em seu art.3º, já não trouxe em seu corpo a expressão propriedade.

Vigente até a atualidade, a Lei n.º 9.610/98 entra em vigor após uma longa tramitação de 8 anos, novamente sem determinar a natureza do direito de autor e mantendo a reputação como bens móveis. Ou seja, uma lei que nasce ultrapassada para a realidade digital que começava a se instaurar...

Chega-se ao contexto atual deste ramo do Direito. A Humanidade vive numa era de modernização constante: o ciberespaço é a realidade. A Internet pulverizou a possibilidade de copiar obras protegidas. A divulgação das cópias é instantânea. Facebook, Twitter, Youtube, Instagram... A informação se propaga com a velocidade da luz: caiu na rede, viralizou. Esta rapidez e capacidade fortificou o argumento de prejuízo e levou a uma superioridade da proteção dos interesses econômicos perante os públicos. Entretanto, impende frisar que nenhum direito pode ser absoluto, mas o direito de autor está cada vez mais absoluto, suas limitações estão sendo suprimidas por todo o mundo. O “risco iminente” de causar prejuízo virou justificativa suficiente para tal supressão.

Nossa legislação segue obsoleta, sem previsões de limites para fins de interesse público ou atualizações mais condizentes com a realidade digital. O futuro desta legislação? Uma atualização inafastável, como restou demonstrada neste breve percurso histórico.

Escrito por
Mulher vestindo uma blusa azul e sorrindo para a câmera

Marissol Pinheiro

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Advogada Plena, Direito da Propriedade Intelectual em Lima Feigelson Advogados.

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