Já imaginou poder aproveitar do conforto da sua casa o Parque Nacional do Grand Canyon ou o Arquipélago de Fernando de Noronha ou assistir a uma luta de gladiadores romanos no Coliseu de Roma?
Acredite ou não, isto em breve poderá ser possível!
Mas, Jean, como!?
De antemão, esse texto não se propõe a questionar o termo, nem tão pouco o seu uso. Apenas gostaria de expressar ao leitor que o artigo que aqui se esboça foi elaborado em outubro de 2021, sendo certo que muito da futurologia que se apresentará no presente texto poderá se concretizar, ou, para embaraço do autor, ser apenas lida como uma análise histórica dos devaneios de um período no mínimo complexo.
Feito este disclaimer, te respondo: Já ouviu falar em Metaverso?
Se não ouviu, te aviso que está em curso uma revolução maior que a popularização da internet na década de 1990 e dos smartphones no início do milênio.
A palavra, combinação do prefixo “meta”, que significa além, e “verso”, que se relaciona com o universo, apareceu pela primeira vez em 1992 no livro de ficção científica “Snow Crash”, do escritor Neal Stephenson. Em sua história, as pessoas usaram de realidade virtual para interagir dentro de um mundo de tecnologia semelhante a um jogo.
O Metaverso, contudo, está prestes a sair das páginas de ficção científica e ganhar o mundo real. Em setembro, o Facebook anunciou investimento de US$ 50 milhões para construir seu próprio Metaverso, afirmando que
“o Metaverso tem o potencial de ajudar a destravar o acesso a novas oportunidades criativas, sociais e econômicas”.
Meses antes, a Epic Games, empresa de jogos eletrônicos por trás da febre mundial Fortnite, levantou US$ 1 bilhão em uma rodada de investimentos para financiar “sua visão de longo prazo para o Metaverso”.
Não se pode olvidar que a Covid-19 impulsionou a demanda por digitalização de processos físicos. Empresas e usuários têm buscado manter a produtividade do trabalho remoto, apesar das limitações, e reinventar os eventos empresariais, outrora físicos, que atualmente alcançaram o limite da exaustão mental causada pelas videochamadas. Há, portanto, uma nova demanda por interação social sem exposição física.
E o Metaverso caminha para ser a solução. Esta nova realidade transporta o usuário para uma realidade virtual que lá permanece focado e conectado o tempo todo sem que a distância física limite a sua capacidade de interação. É um ecossistema com propriedades relacionais profundas e eficientes para pessoas que estão separadas geograficamente onde cada usuário será representado por um avatar. Neste novo universo, quase tudo será possível. Não apenas porque espelhará o mundo real em toda a sua complexidade tridimensional, mas também por capacitá-lo e estendê-lo para ser e fazer o que antes só era realizado em filmes como “Ready Player One” e “Matrix”.
Tecidas estas breves considerações, arrisco a afirmar que há no horizonte uma nova modalidade de meio ambiente. Conceitualmente “meio ambiente” é aquilo que nos rodeia, o que afeta e condiciona as circunstâncias da vida de um sujeito ou de uma sociedade. Nos termos da quarentona e vigente Lei nº 6.938, de 31 de agosto de 1981 (Política Nacional de Meio Ambiente), meio ambiente é “o conjunto de condições, leis, influências e interações de ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas”. Com a criação do Metaverso, não seria o caso de incluir neste conceito a variável virtual? Fica aqui a provocação.
Aliás, etimologicamente, a palavra “meio” significa “gênero neutro”, e ambiente vem de ambiens, que significa “estar em ambos os lados”. Há, inclusive, quem critique que a expressão “meio ambiente” se trate de uma redundância.
De toda sorte, partindo da premissa que o Metaverso se trata de um ambiente, questiona-se como o direito fundamental ao meio ambiente equilibrado – previsto no art. 225 da Constituição de 1988, que consagra e recepciona de forma mais ampla possível todos os aspectos envolvidos do meio ambiente – resguardaria esta nova modalidade?
Ora, se diante do abrangente conceito constitucional de meio ambiente, com o intuito de viabilizar a identificação mais rápida do agente degradante e do bem jurídico degradado, a doutrina jurídica ambiental clássica teve o cuidado de dividir o meio ambiente em múltiplas dimensões, quais sejam, meio ambiente natural, artificial, cultural e do trabalho, não seria o caso de ser criada uma nova classe, a virtual?
Veja. O meio ambiente natural engloba a fauna, a flora, a atmosfera, o solo, os recursos hídricos e todas as dimensões ligadas aos recursos naturais. Já o meio ambiente artificial relaciona-se com o espaço antrópico construído física e concretamente, como edifícios, pontes e todo o meio urbano. Por sua vez, a face cultural protege bens materiais ou imateriais com valores paisagísticos, históricos, artísticos, arqueológicos, ecológicos e científicos. Por fim, o meio ambiente do trabalho se relaciona diretamente à proteção do trabalhador no desenvolvimento da atividade laboral. Não há, portanto, nestas categorias tradicionais, o enquadramento do bem virtual.
Desta forma, perfunctoriamente, ainda que o porvir continue sendo uma terra desconhecida, arrisco responder que sim, serão necessárias a criação de uma nova classe e de normativas que protejam o meio ambiente virtual, sem prejuízo de debater questões ainda mais complexas como a regulação de danos ambientais virtuais – certamente haverá – ou a recuperação destes ecossistemas. Mas este é um conteúdo para outro artigo.
Assim, dada esta nova realidade, sem prejuízo de continuarmos a debatê-los, o tempo e as inovações não param. Uma nova realidade surge no horizonte e com ela novos desafios que carecem de entendimento. Desta forma, cabe ao Direito enquanto ciência estudá-los e integrá-los à sua já vasta e transversal abordagem. Debater os novos desafios de um mundo completamente conectado e digital, em plena revolução industrial 4.0, é preciso.
Conforme expressamos nas primeiras palavras deste texto, todas as previsões e tendências aqui expostas visam elucidar as principais características que julgamos compor o conceito de Direito Ambiental 4.0, e foram apresentadas com o intuito de contribuir com o momento vivenciado.
Acreditamos muito que o Direito Ambiental 4.0 deve ser o caminho para se reconectar o universo jurídico com a nova realidade do desenvolvimento (sustentável) posta. O futuro está sendo escrito neste momento, e em breve você poderá ler mais artigos como este, deitado em uma rede na praia sob a sombra de um coqueiro, bebendo uma água de coco, tudo no Metaverso. Nos vemos lá!